Moeda digital da China mostra ambições geopolíticas do país

Objetivo declarado da China com emissão de uma moeda digital soberana é ser uma alternativa ao dólar no comércio internacional e driblar sanções financeiras

Por Redação  /  26 de maio de 2020
© - Shutterstock

O governo chinês anunciou recentemente o início dos testes do e-RMB, moeda digital numa blockchain pareada em 1:1 com a moeda fiduciária chinesa e respaldada pelo banco central do país. O anúncio despertou o interesse não só da comunidade de criptomoedas, como de todo o sistema financeiro internacional. A pergunta é: qual o objetivo do governo chinês ao emitir uma moeda digital própria e quais os impactos que isso pode ter na economia mundial?

O principal objetivo parece estar relacionado a um maior controle do governo chinês sobre as transações com sua moeda. Com uma moeda própria, o governo teria condições de rastrear em tempo real todas as transações feitas entre seus cidadãos. “Embora haja pouca mudança para o usuário final, da perspectiva de supervisão do banco central, isso é uma mudança e tanto”, afirmou o professsor Xu Yuan, do instituto de desenvolvimento de pesquisa naciona da Peking University em entrevista à CCTV, TV estatal chinesa.

Por exemplo, o país poderia ter maior controle dos recursos contra lavagem de dinheiro e evasão fiscal. Além disso, o banco central pode usar um sistema de codificação para controlar como o dinheiro é usado. Ou seja, se o banco central transfere recursos destinados empréstimos a pequenas empresas para um banco comercial, ele poderá garantir que o dinheiro só seja ativado quando de fato fora transferido para uma.

Outro objetivo declarado do e-RMB é ser uma alternativa ao dólar nas transações internacionais. “Uma moeda digital soberana fornece uma alternativa ao sistema de liquidação em dólar e atenua o impacto de quaisquer sanções ou ameaças de exclusão, tanto em nível de país quanto empresarial”, afirmava uma reportagem do jornal estatal China Daily. Portanto, um objetivo declaradamente geopolítico e mais um elemento na guerra comercial entre a China e os EUA.

moeda digital da china
Moeda digital da China ameaça dólar como moeda de liquidação internacional

O tratado de Bretton Woods, após a Segunda Guerra Mundial, instaurou o dólar como moeda de reserva. E, consequentemente, deu aos Estados Unidos uma vantagem sobre os outros países, já que o país detém a emissão da principal moeda de liquidação no mundo todo. Com isso, o país controla a emissão de dinheiro em nível mundial. Ao emitir uma moeda própria, o governo chinês parece estar querendo atacar justamente esse domínio.

Uma moeda digital soberana fornece uma alternativa ao sistema de liquidação em dólar e atenua o impacto de quaisquer sanções ou ameaças de exclusão, tanto em nível de país quanto empresarial.

Um outro aspecto é a possibilidade de a moeda ser um instrumento para driblar sanções financeiras internacionais. Dessa forma, Pequim poderia fazer negócios livremente com nações que se colocam em oposição aos Estados Unidos e, por isso, sofrem restrições no comércio internacional. Seria uma maneira de o governo chinês ampliar a sua área de influência e fortalecer esses regimes. E é um dos pilares da tese de investimento da Transfero que prevê a perda de influência do dólar no comércio internacional e seu consequente enfraquecimento.

Vale lembrar que os pagamentos digitais já são bastante populares no país. Assim, não é incomum ver pequenos comércios aceitarem esses meios de pagamento de forma bem natural. No ano passado, os pagamentos digitais somaram US$ 49 trilhões. Portanto, se o objetivo fosse apenas facilitar transações entre cidadãos, não haveria necessidade criar uma moeda digital emitida pelo Estado.